O (a) sr. (a) concorda com a remissão de pena por livro lido?
SIM – Muito tem se discutido sobre a situação do sistema penitenciário. Parece-nos que a opinião sobre a ressocialização tem encontrado bem mais adeptos do que anteriormente, no entanto, o discurso esbarra ainda no senso comum: quero ressocializar, mas… Ou seja, quero incluir, mas sem dar chance para que esta pessoa possa ter uma nova chance e uma nova história. Aqui vale ainda nota que remição não é regalia, é direito adquirido, previsto na Lei de Execução Penal e tratados internacionais, que significa resgate ou reaquisição de direito (bem diferente etimologicamente da palavra remissão, com SS, que quer dizer perdão ou absolvição). Bom falar em resgate, porque esta tem sido palavra muito utilizada e é importante dentro do contexto da ressocialização dos privados de liberdade. E o nosso pensamento tem fundamento essencial: sem a possibilidade de resgatar este sujeito, não há como devolver à sociedade um ser humano melhor e a execução penal se torna inócua. A privação de liberdade não pode ter por fim absoluto a punição pelo crime, posto que uma das finalidades da Lei de Execução Penal é a recuperação do ser humano. Se a função da pena é ressocializar, não se pode apenas segregar. Precisamos avançar para entender melhor a função social da pena de prisão. Por isso, ficamos muito felizes com a aprovação da Lei da Remição pela Leitura no âmbito dos estabelecimentos penais do Ceará. Calcada dentro dos princípios federais sobre a matéria, trata-se de uma regulamentação estadual ao que já está na Lei de Execução Penal, nas recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). O que o Ceará fez foi regulamentar matéria já existente. Com esta conquista, ganha a política pública estadual do sistema penitenciário que passa a estimular e fomentar a educação prisional também em atividades extracurriculares, como a leitura de livros. Seguimos acreditando na máxima do célebre Monteiro Lobato: um país se faz com homens, mulheres (permita-me um adendo de gênero) e livros.
“Precisamos avançar para entender melhor a função social da pena de prisão”
Mariana Lobo, Secretária da Justiça e Cidadania do Ceará
NÃO – O governador Cid Gomes apresentou projeto de remissão de pena pela leitura, conferindo ao condenado 4 dias a menos na prisão por livro lido no mês, podendo ler 12 no ano, ou seja, 48 dias a menos na sua pena anualmente. Embora se trate de medida simpática aos olhos de alguns, merece ser censurada sob vários aspectos, dentre os quais a sua constitucionalidade, vez que se trata de competência da União legislar sobre matéria penal, processo e execução penais.
A respeito da execução da pena, a lei federal 12.433/11, estabelece a possibilidade de remissão por trabalho ou por estudo, devendo, nesta hipótese, a ocorrência de frequência escolar – atividade de ensino fundamental, médio, profissionalizante, superior, ou ainda de requalificação profissional. A proposta governamental esbarra nessa lei, pois não se enquadra a simples leitura em estudo regular, mesmo mediante avaliação. A leitura serve como mero deleite, busca de conhecimento, de reconstrução, de entretenimento, sendo um item a mais no processo de ressocialização. Porém, inadmissível que ressocialização seja sinônimo de redução de pena. A lei penal é muito branda. O homicida, por exemplo, condenado a 10 anos de prisão passa apenas 1 ano e 8 meses preso, o que é inaceitável. Defendo que o crime de homicídio seja punido com pelo menos 15 anos em regime fechado e somente a partir daí é que se poderia pensar em regressão de pena. A condenação deve servir como medida efetivamente punitiva, evitando que alguns condenados tenham o sentimento de impunidade, como já sentem pela totalidade de quase 95% dos crimes de homicídio se tornarem impunes, pela incapacidade do Estado de desvendá-los. A falência do nosso sistema penitenciário, desumanizado, principalmente no Ceará, deve-se à ausência do Estado em promover a real qualificação dessas pessoas. A justiça restaurativa deveria ser fomentada na potencialidade produtiva dos presos à inserção no mercado de trabalho. A leitura, pela simples leitura e sem o ensino formal, não propiciará a revitalização do sistema penitenciário brasileiro.
“Condenado a 10 anos de prisão passa apenas 1 ano e 8 meses preso”
Heitor Férrer, Deputado estadual (PDT/CE)